Calúnia e difamação nas redes sociais

As redes sociais são um fenómeno digital muito popular e transversal não só ao nível etário, mas também demográfico.

  • Opinião
  • Publicado: 2023-11-03 15:18
  • Por: Frederico Mateus Candeias

Esta popularização de interatividade social que as redes sociais proporcionam aos seus utilizadores, veio revolucionar a forma como as pessoas comunicam, fazem negócios, como se comportam e se relacionam.

Para o bem ou para o mal as redes sociais implantaram-se no nosso quotidiano e representam um espectro digital incontornável de encontro de pessoas, cuja partilha e comunicação entre elas é mote da relação.

É claro que este campo de interatividade tem evoluído, e apesar de todas as potencialidades que apresenta, também transporta consigo algumas ameaças aos seus utilizadores.

Não é nosso propósito apontar as imperfeições destes espaços públicos virtuais, no entanto assumimos o papel de alertar para as consequências que se podem incorrer por comportamentos impróprios mantidos nestes territórios sociais digitais.

A difamação como ato ofensivo da honra, apresenta a configuração de crime, independente do ato ocorrer num espaço físico ou digital.

O código penal Português dedica o artigo 180º ao crime de Difamação, no capítulo VI, que tem o título “Dos crimes contra a honra”.

De uma forma geral, poderá ser culpado quem:

  • Se dirigir a terceiro e incriminar ou responsabilizar alguém, mesmo sobre forma de suspeita, ofendendo dessa forma a sua honra;

  • Se dirigir a terceiro e formular juízo sobre alguém, ofendendo dessa forma a sua honra;

  • Reproduzir de alguma forma as ofensas à honra de alguém, mesmo que inicialmente feitas por outra pessoa.

Não existe distinção entre as ofensas feitas de forma verbal, por escrito, por gesto, imagem ou outros meios de expressão. Todos são equiparados de acordo com a legislação em vigor.

O crime de difamação é sempre realizado de forma indireta, ou seja, alguém é ofendido ou acusado por uma pessoa que se dirige não a ele, mas a terceiros. Se a ofensa fosse realizada de forma direta estaríamos perante um crime de injúria.

De acordo com o código penal, esta conduta pode ser punida com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 240 dias.

No caso de a ofensa se realizar através de um meio que potencie a sua propagação, como a Internet por exemplo, a lei considera a situação mais grave e as penas são elevadas em um terço dos seus limites normais.

A prática de uma infração penal pode fundar duas pretensões dirigidas contra os seus agentes: uma ação penal, para julgamento, e, em caso de condenação, aplicação das reacções criminais adequadas, e uma ação cível, para ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais a que a infração tenha dado causa. O art. 129.º do Cód. Penal refere-se à responsabilidade civil emergente de crime e à indemnização por perdas e danos emergentes de um crime, determinando que esta seja regulada pela lei civil. De acordo com o art. 483.º, n.º 1 do Cód. Civil são os seguintes os pressupostos da responsabilidade civil por facto ilícito: O facto do agente, ou seja, «Um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma da conduta humana»6 podendo este resultar de ação ou de omissão; a ilicitude do facto, isto é, a violação de um direito alheio ou de uma disposição destinada a proteger interesses alheios; o nexo de imputação do facto ao lesante, objetiva e subjetivamente; a existência de dano ou prejuízo, consistindo este na ofensa de bens ou interesses alheios protegidos pela ordem jurídica, ou noutra formulação, na supressão ou diminuição de uma situação favorável tutelada pelo Direito; a existência de um nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano, que traduz a imputação objetiva dos resultados danosos ao comportamento do agente, de maneira a determinar-se quais os danos verdadeiramente causados por este e, nessa medida indemnizáveis.

Independentemente, do meio que for utilizado para a prática desses factos. Assim, se uma pessoa imputar sobre alguém um facto ou formular sobre ela um juízo através, por exemplo, das redes sociais, através de um fórum, estará a praticar um crime em ambiente digital. 

 

Quando pode acontecer este crime de difamação em redes sociais?

  1. Alguém fala em público (stories do Instagram) que determinada pessoa é de uma determinada forma e ofende a honra dessa pessoa;

  2. Alguém começa a difundir factos errados e ofensivos de uma pessoa através de publicações;

  3. Alguém começa a criticar ofensivamente e publicamente o trabalho (cursos, e-books) de outra pessoa.

A enumeração destas situações são meramente indicativas, pois, a lista de situações, podia ser muito mais extensa.

A lei penal não faz diferença entre a difamação que ocorra perante meios mais comuns e aquelas que ocorrem em ambiente digital. O que é certo, é que em ambas as situações estamos perante um crime de difamação, nos termos já mencionados. 

Pelo que, a forma de reação será a mesma, mediante a apresentação de uma queixa-crime nos serviços competentes.

Outra problemática, nestes casos, é a prova que, por ser em ambiente digital, pode ser tornada privada e de difícil obtenção. A título de exemplo, são as stories que são eliminadas no prazo de 24h. Os meios de obtenção de prova, nestes casos, devem ser de rápida aplicação, cabendo, na minha opinião, ao ofendido tirar prints das publicações em questão.

Sendo certo que será sempre necessário avaliar cada caso, pois poderá ser necessário, tendo em conta as circunstâncias, efetuar outras ações com vista a impedir/combater esta situação.

Tenha-se em conta que esta questão é particularmente importante nos casos em que

não se consegue determinar o local da prática do crime. Se ocorrer um crime, por exemplo, numa rede social que se encontra sediada nos Estados Unidos da América, como é exemplo o Facebook, é difícil definir em que país é que o mesmo ocorreu. Não se trata de uma questão jurídica mas sim prática: entramos aqui numa outra questão que são os pedidos de identificação de endereços IP.  Na minha opinião se um utilizador da Internet, situado no nosso país, receber uma informação proveniente de território estrangeiro, que constitua crime à luz do Código Penal Português e produza o seu resultado típico em Portugal, o crime considera-se praticado em Portugal.

Cada computador possui um Internet Protocol, vulgarmente conhecido como endereço IP. O IP é um endereço numérico, responsável pela identificação das máquinas, das redes e também pelo encaminhamento correto das mensagens entre elas.

O Relatório da atividade relativo a 2013 do Gabinete Cibercrime refere que os dois tipos de cibercrime com maior número de queixas foram, em primeiro lugar, a criação de falsos perfis nas redes sociais, em particular no Facebook e, em paralelo, os blogues com conteúdos difamatórios, onde se incluem também os comentários com teor difamatório de terceiros. Tal é corroborado com o Relatório global sobre pedidos governamentais do Facebook107, que abrange o primeiro semestre de 2013: Portugal foi o 14.º país a enviar mais pedidos de informações (177 pedidos), dos quais 42% foram respondidos.

Existem alguns casos relevantes nos quais é aplicada a responsabilidade civil, de forma objetiva ou subjetiva, assim, em alguns casos, dependerá o entendimento do magistrado, que poderá condenar o servidor, o site e a instituição financeira (Google, por exemplo). Partindo desse ponto, com o avanço global das redes sociais, como Facebook, Twitter, por consequência, aumentam também o dano à imagem, à honra e à dignidade da pessoa.

Em Portugal, de forma sucinta, a tipificação dos crimes virtuais se deu com o advento da lei no 109 de 1991, na qual são previstas figuras penais na área de informática. O referido diploma legal prevê punição para algumas condutas, a seguir relacionadas.

Falsidade informática, conforme dispõe seu art. 4º, sendo penalizada a introdução, modificação ou supressão de dados ou programas informáticos, com o intuito de falsear a obtenção de dados eletrônicos, tendo pena de prisão prevista de um a cinco anos.

Danos a dados ou programas informáticos, conforme disposição do art. 5º, que prevê como conduta ilícita a destruição de dados eletrônicos ou de programas de computador, seja com o simples objetivo de dano ou, ainda, com o intuito de obter alguma vantagem ilícita.

Assim, a lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, aprovou a Lei do Cibercrime. Tal como define o artigo 1.º, o objeto da referida lei são as disposições penais materiais e processuais, bem como as disposições relativas ao domínio do cibercrime e da recolha de prova em suporte eletrónico.

Entende-se assim que, para os crimes contra a honra cometidos através da internet, a lei aplicável continua a ser o Código Penal.

Nota-se, assim, que o Direito português já avançou consideravelmente dentro da legislação virtual, pois já normatizou e previu punições às principais causas e aos factos que determinam crimes dentro das relações ocorridas do mundo digital.

PUB

PUB

PUB

PUB