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Porque sobem os preços da energia e dos combustíveis?... A culpa é do clima.

No primeiro texto fica uma explicação do que é o mercado regulado do carbono na Europa e de como ele, enquanto mecanismo de mitigação da emissão de gases de efeito de estufa (GEE), afeta os preços das indústrias que estão sob o seu regime, assim como os aumentos exponenciais do preço neste mercado das licenças de carbono (CELE), interfere cada vez mais, nos preços finais de bens e serviços que resultam dessas indústrias, como tem sido o caso da energia e combustíveis fósseis.

  • Opinião
  • Publicado: 2021-10-31 17:10
  • Por: Antero A. Carvalho

No segundo texto mostro o que resulta alem do designado mercado regulado, ou seja, de todas as atividades que se encontram fora desta regulação, que neste caso, mercado não-regulado se passou a designar por mercado voluntário, uma vez que todas as ações e políticas de mitigação são intentadas através de incentivos e não de leis/regulamentos que obriguem ao seu estrito cumprimento, como no caso do CELE. Aponto também alguns dos instrumentos que se têm tentado implementar para trazer resultados de redução de emissões dentro deste mercado voluntário e os desafios que este enfrenta e enfrentará no futuro.  

Nos terceiro e quarto textos, aponto para um futuro de incertezas quanto aos cenários inevitáveis, que sendo certos, desconhecemos a intensidade com que eles se manifestarão, mostrando, no entanto, uma matriz de solução que terá de ser cada vez mais, integrada, participativa e voluntária, por parte dos diferentes intervenientes da UE: estados, países, cidades, regiões, empresas e cidadãos. Esta passará sempre por uma intervenção coordenada entre os governos nacionais e EU, mas por uma ação de baixo para cima, a partir dos cidadãos e dos seus habitats, as cidades.

O que é o Mercado Regulado das licenças de carbono?

A subida do preço da energia elétrica e dos combustíveis fósseis que se têm refletido de imediato nas faturas dos consumidores, tanto das famílias como das empresas, é um dos assuntos que está a marcar o dia a dia de todos nós.

Alem do fenómeno direto do aumento dos preços, surgirá com maior frequência a escassez de determinados produtos que até aqui eram comuns/acessíveis e que por consequência do impacto que a sua produção e distribuição pouco sustentável levantam, serão objeto de forte e apertada legislação que gerará também ela, um consequente aumento do preço/escassez.

No dia 14 de outubro de 2021 Portugal assistiu a um marco histórico, em alguns postos de abastecimento de combustível, chegou-se a ver superada a barreira dos 2,00€/lt da gasolina 98. Não pense que estas subidas, são idênticas às habituais flutuações com que o mercado do petróleo nos tinha habituado, em parte resultado das especulações, em parte resultado das necessidades de cobrança de impostos nacionais. O mesmo serve para explicar os recordes que o preço da energia elétrica tem vindo a apresentar, também neste caso, a explicação tem origem diferente das que no passado, o eram de fato per si.  

O fenómeno não é nacional, muito embora, fruto das diferentes políticas nacionais do passado que refletem diferentes preços para o mesmo KW de energia ou litro de combustível, e mesmo quando comparados entre países do mercado comum, entenda-se, união europeia, pareça que o problema é interno, e que a razão se encontra, como no passado, simplesmente refletida na política de impostos nacionais. 

 Se no passado essa era uma razão válida, desde que se lançou a Agenda do Clima que paulatinamente esta, tem vindo a acelerar a capacidade que as políticas e metas de descarbonização têm em afetar o aumento dos custos de produção, onde as indústrias mais poluentes, são desde a criação do mercado regulado de carbono, obrigadas a refletir a sua pegada de poluição nos preços de produção, através da aquisição das designadas licenças de poluição (ou licenças de carbono). 

Por conseguinte, a capacidade de nacionalmente os governos virem a ter qualquer influência direta sobre a precificação desses produtos e serviços deixa de existir como no passado, enquanto razão única ou principal.

De facto, atualmente a instrumentalização da precificação do custo da chamada pegada de poluição das indústrias e serviços que estão sob a obrigação de reportar a este mercado, Mercado Europeu de Licenças de Emissão (CELE), não depende de regras ou políticas nacionais e até mesmo, a própria UE, cinge-se a fazer refletir nos rácios de aumento do preço do carbono e equivalentes (CO2eq), as metas que a UE se propôs alcançar nas diferentes épocas de todo este processo de descarbonização. 

É por isso que afirmo inicialmente que “a culpa é do clima”, ou melhor, das alterações climáticas que consequentemente são resultado dos comportamentos humanos, pois este é o fator determinante que faz com que o maior ou menor agravamento do problema, face às metas a que estamos obrigados a atingir, provoque diretamente e indiretamente a afetação dos preços de mercado. 

Este é um mecanismo de ajustamento, que entre outros instrumentos usados para resolução do problema, vêm desde o protocolo de Quioto, mais recentemente com o Acordo de Paris, e já este ano, após nova avaliação cientifica do órgão que produz os estudos que permitem aos governos e comunidade internacional acompanhar a evolução do problema, o Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), a EU realinhou as suas politicas com as novas metas, anunciando para o efeito o pacote legislativo “FIT for 55”, conjunto de medidas pensadas para colocar em prática politicas que levem ao objetivo de redução de 55% de emissões até 2030, e assim conseguir atingir a neutralidade em 2050.

Embora se calcule que a influência direta sobre os preços da energia e combustíveis que o “imposto de carbono” tem, represente em média entre os 3% a 4,5%, esse fator seria verdadeiro como principal determinante para compreender o que está na origem atualmente desses aumentos, se a cotação da tonelada de CO2eq no CELE se mantivesse  num tendência regular/estável, como ocorreu no passado, no entanto, face aos cenários de aumento exponencial deste preço, devido, entre outros factores, ao processo programado de redução das cotas de poluição autorizadas e à constatação que à medida que o tempo passa, só estas medidas não se mostram capazes de travar o problema, o que levará a uma tendência óbvia para um aumento significativo, mas desconhecido deste “imposto de poluição”. 

Desta forma, os diversos setores de atividade que são regulados pelo CELE, são obrigados a fazer refletir essas flutuações e incertezas, criando o que a opinião pública e até a classe política tem denominado de movimentos especulativos. Saliento que estes, são efetuados de forma metódica e perfeitamente dentro da lei, uma vez que eles representam os preços dos custos de produção determinados pela subida do aumento do custo tonelada de carbono e equivalente (tCO2eq) presente e futuros. 

Junte-se lhe a isto, a pressão sobre a procura, resultado da retoma das economias que estavam confinadas devido à pandemia e temos a tempestade perfeita.

Mas o que é este mercado do carbono e como funciona?

O Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) é um mecanismo de regulação das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) em atividades que são responsáveis por cerca de 40% das emissões da União Europeia, como exemplo; combustíveis, a refinação de óleos minerais, a metalurgia, a produção de clínquer, cal e vidro, a cerâmica, a pasta e papel, os químicos e a aviação.

Este mecanismo, para além de definir limites de emissão de GEE por indústria/empresa, estabelece um limite para as emissões do conjunto das instalações e operadores, permite que as empresas negociem entre si as licenças emitidas, dentro do limite global atribuído. Parte das licenças de emissão é atribuída gratuitamente, como regra transitória deste regime, e como mecanismo para evitar “fuga de carbono”, ou seja, a transferência da produção para países onde as restrições em matéria de emissões são menos rigorosas.

Uma licença de emissão permite a emissão de uma tonelada de dióxido de carbono ou equivalente (CO2eq) durante um determinado período. A obtenção de licenças de emissão é feita, por regra, através de leilão. As receitas geradas pelos leilões das licenças de emissão atribuídas a Portugal integram o Fundo Ambiental, sob a tutela da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).

O limite global de emissões de GEE definido a nível da UE tem sido reduzido ao longo do tempo. No quarto período de implementação do CELE (2021-2030) foi introduzido um fator de redução linear de 2,2% na quantidade total de licenças de emissão disponíveis (em vez de 1,74% no período 2013-2020). Esta redução progressiva, cria pressão sobre os custos de produção destes setores, gerando aumentos, por necessidade de inovar na cadeia de produção com tecnologias mais eficientes ambientalmente, e/ou caso não ocorra, pelo maior peso que as licenças para poluir têm na sua produção.  

Para se ter uma ideia, no mercado regulado, entre 2012 e 2017 os preços mantiveram-se entre os 4 e os 7 €/tCO2, em 2018 houve um disparo do preço, passando dos 7 para os 24 €/tCO2 em outubro de 2021 o preço passou a barreira dos 60€/tCO2, havendo modelos preditivos que apontam para se chegar entre 2026-30 à barreira, inimaginável há uma década, dos 200 a 250,00€/tCO2. 

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NOTA: Pela complexidade do tema que obriga a uma relativa extensão do texto, numa segunda parte deste artigo, darei continuidade, com os subtítulos/repostas às seguintes questões:

E as atividades que não são obrigadas a estar no mercado regulado?

Como isto nos irá afetar: em que dimensão e intensidade?

Como pode uma região, uma empresa ou uma família, torna-se resiliente a este problema que afetará os preços dos produtos, bens e serviços? 

Antero A. Carvalho - Gestor e Consultor

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